quarta-feira, outubro 29, 2003

- 102, bom dia. Posso ajudar?
- Preciso do telefone de um chaveiro perto do aeroporto.


Pois é, depois que seu irmão vem visitá-la e na hora de ir embora consegue acionar a trava da porta do lado do passageiro e trancar tudo, tudo (leia-se a minha vida: chave do carro na ignição, bolsa, celular, chave casa) dentro do carro mal estacionado não há mais o que se dizer. Ai você respira fundo, conta até dez, lembra que vai ter de encarar com serenidade, afinal faz terapia para isso. Por outro lado quer se matar porque lembra que como eram 6 horas da manhã, você ainda não tinha engolido a meiota da boleta do bem do dia. Ai você quase chora, mas resolve que não. Afinal, o problema não é seu, e sim do seu irmão. Você liga ao 102, pede um chaveiro perto do aeroporto, mas só tem na Cidade Baixa. O cara atende com voz de sono. Você senta e espera ao lado do seu irmão, que já fez o check-in. Você ainda o avisa de que será provavelmente explorada, quase que sexualmente pelo chaveiro, que vai te enfiar a faca (ou a chave). Mas ele, branco, diz que pagará tudinho.

Eis que chega o chaveiro. Honesto, limpinho, seus 50 anos: “Vamos combinar o preço antes: nesse horário eu cobro R$ 50”. Combinar? Como assim, cara-pálida? Numa situação dessa, eu teria de topar até por R$ 200. Falei, tá bom (pelo menos na minha fantasia ele cobraria uns 100 pilas).

Ai, ele enfia um arame no seu carro e você do outro lado só ouvindo uns arranhões uns scratchhhs, e ichhssskkksss e lembrando que você ama o seu carro. Tipo, o seu bebezão. Mas antes um bebezão com uns arranhões do que estacionado torto na frente do embarque de Porto Alegre pro resto da vida. “Seu carro é superfácil de abrir. Abriria de primeira, mas sua maçaneta está muito dura.” É, é assim. E eu sentada na calçada com o cabelo desgrenhado (o plano era deixar o irmão e voltar para a cama na seqüência por mais 1 horinha). Ainda bem que resolvi não ir de pijama. Enquanto o arame estuprava o espaço entre o vidro do carro e o carro, eu fazia força do outro lado. Bom, parece que 45 minutos depois funcionou. Peguei até um cartão do chaveiro limpinho. E um adesivo, para colar em local visível (quem sabe no batente da porta, do lado de fora de casa, para a próxima vez que eu me trancar fora).

Bom, depois disso, qual a graça contar que seu irmão passou o fim de semana por aqui, que a mulherada se assanhou, que eu passei mal no Gum, fui ao banheiro e consegui vomitar e ainda voltar para a mesa como se nada tivesse acontecido, que consegui ir à Ice e ver que sair de sábado é Uó, que vi Irreversível e seus 12 minutos de estupro e muita violência, que vi Bem me Quer, Mal me quer, com a Audrey Tatou, que mesmo representando uma erectomaníaca tem cara de Amélie Poulain e que trabalha muito bem num filme muito bom. Bom, depois da chave no carro, isso é nadinha, de nada. Certo? Como diz a propaganda, tem coisas que não têm preço.

Um comentário:

Anônimo disse...
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